sábado, 5 de junho de 2010

DEBATE


VOCÊ ACREDITA EM LAGARTIXAS?

EU NÃO ACREDITO EM LAGARTIXAS
(Lian Tai)

Quando criança, as lagartixas me provocavam asco. Eu ficava verdadeiramente enojada, ao vê-las pegajosas na parede. Nunca me esqueço de uma, em especial, na casa da minha avó, em São Paulo. Era de um branco transparente, que me deu não apenas nojo, mas uma profunda angústia. Era um modo muito cru de ver o mundo, deparar-me, assim, com uma lagartixa e suas entranhas.

À medida que fui crescendo, o medo de lagartixas foi passando. Encontrei outro inimigo: os pernilongos. Estes, sim, odiáveis até hoje. Pequenas criaturas com um zumbido irritante, que até poderia passar despercebido, não fosse o prenúncio de ameaça iminente. Além de fazer questão de voar bem rente ao ouvido, como se quisessem entrar, ainda por cima picam impiedosamente. Um só pernilongo é capaz de realizar uma tortura das mais cruéis, deixando-nos marcas vermelhas, que coçamos até que se transformem em ferida.

O ódio aos pernilongos foi capaz de fazer nascer em mim uma profunda simpatia pelas lagartixas, pois diz o senso comum que estas comem aqueles insetinhos irritantes. Passei, pois, a sorrir-lhes, quando as via na parede ou pelo teto. Eram minhas cúmplices na luta aos pernilongos.

Porém devo dizer que o apreço que adquiri pelos bichinhos pegajosos parte de um aspecto puramente simbólico, pois, se me perguntarem se acredito que as lagartixas realmente comem pernilongos, digo que não. Pois bem, sempre que as vejo, elas estão paradas, em um repouso relaxante. Para começar, elas estão naturalmente em estado de descanso, tanto que ela SÃO deitadas. Lagartixas não se deitam, sentam ou levantam. Elas estão perenemente na posição de sono repousante.

Já os pernilongos são insetos pentelhos, ágeis, barulhentos. Tenho certeza de que são hiper-ativos. Voam de um lado para outro do cômodo em frações de segundos, sem que possamos alcançá-los. Pernilongos fogem à nossa vista, quando olhamos eles já não estão lá, ao contrário das lagartixas, que nos dão a impressão de que o tempo parou, já que permanecem imóveis no mesmo espaço.

Quando as lagartixas resolvem andar, elas até conseguem velocidade significativa, mas é um evento raro. Tanto que, não fosse por elas normalmente ficarem em lugares altos, como paredes e tetos, a maior causa de mortes seria por pisoteamento. Quantas lagartixas morrem simplesmente porque não saem do caminho quando as pessoas passam distraídas? Elas continuam estiradas preguiçosamente.

Ao comparar o comportamento das lagartixas com o dos pernilongos, fica óbvio que elas não os comem. É a conclusão natural, quando consideramos que nossas amigas pegajosas são extremamente lerdas e não teriam capacidade para perseguir um inseto tão ágil. Se elas tivessem teias, como as aranhas, aí, sim, poderiam capturar uns mosquitinhos que passassem. Mas não, as lagartixas são sonsas, paradas, deitadas e não possuem teias ou outros artifícios, portanto a idéia de que elas comem nossos inimigos pernilongos é apenas um mito e não corresponde ao mundo dos fatos.

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EU ACREDITO EM LAGARTIXAS
(Marina Mota)

Nasci numa cidade no interior de Minas e sempre morei na mesma casa, onde meus pais ainda moram. Lá, desde que me entendo por gente, convivo amigavelmente com criaturinhas, muitas vezes consideradas nojentas, denominadas lagartixas. Elas nunca me causaram incômodo ou asco, nada do gênero, sempre foram simples presenças, ali, principalmente no alpendre de casa. Eu e meus irmãos nos divertíamos tentando arrancar os rabos delas, depois que minha avó nos contou que eles se reconstituíam. E conseguimos algumas vezes, depois ficávamos dias procurando nossa vítima para ver o que acontecia. Algumas vezes presenciamos a evolução de novos rabos, mas não sei dizer se eram das mesmas lagartixas que havíamos amputado.

Acredito que as lagartixas despertaram em mim um tipo de curiosidade científica. Eu também achava o máximo ficar olhando-as através do vidro, contra a luz, pois assim quase dava para ver cada um de seus órgãos internos. Aprendi muito sobre as lagartixas observando-as cuidadosamente.

Dia desses, conversando com uma amiga, ela questionou as lagartixas e me senti no direito de defendê-las. Minha amiga acha que as lagartixas são bobas demais diante de um inseto, e não acredita que elas sejam capazes de se alimentar deles.

Na realidade, devido à convivência, posso explicar algumas coisas óbvias, que esta minha tola amiga não compreende. Primeiro fato: As lagartixas são tão espertas, mas tão espertas, que fingem de bobas para viver. Lagartixas seriam ótimas atrizes se não fossem meros répteis. Elas sabem da habilidade de um mosquito, de um pernilongo, sabem da velocidade que eles possuem, então ficam ali, paradonas, aparentando quase um sono profundo, se não fosse pelos enormes olhos abertos; e quando menos se espera – nhac – coloca toda a flexibilidade de sua língua extensível a seu favor e lá se foi o pernilongo, menos um no mundo para nos atormentar.

É claro que para isto elas também usam de outro artifício. Fato número dois: Elas se organizam na hora das refeições o mais próximo possível de onde os insetos preferem ficar. É óbvio que elas são de fato um bocado mais lentas do que eles, mas no alpendre da minha casa, por exemplo, elas ficam paradas perto das duas luzes que temos lá. Eu já presenciei várias vezes uma convenção de insetos rodeando as luzes, como de costume, e outra de lagartixas ao redor, preparando o bote.

O engraçado é que acabo de me lembrar de um episódio curioso a que assisti. Um dia eu estava em casa e me deparei com uma barata das grandes (também não sou dessas que tem medo de baratas, vou ao encontro delas, piso e pronto, fim da história). Mas estas sim são bichinhos espertos, quantas vezes já corri desesperadamente com um chinelo na mão, ou no pé mesmo, atrás delas. Foi assim nesse dia, mas dessa vez a barata ganhou a corrida e saiu com vida. Horas depois, saindo de casa, vi uma lagartixa com metade da barata dentro da boca e a outra metade de fora. Via-se o esforço dela para terminar esta refeição, mas só mais alguns segundos e – pluft – barata no estômago quase visível da minha amiga lagartixa! Saí satisfeita. Não sei se era a mesma barata com quem travei uma luta mais cedo, porque minha casa também é morada de grandes baratas, mas isto é história para outro dia. Mas é por isto e por tantas outras que eu defendo as lagartixas e digo à minha amiga: Sim! Eu acredito que lagartixas se alimentam de pequenos e grandes insetos aparentemente mais espertos que elas. E eu já vi. Se quiser ver, um dia eu te mostro meu centro de pesquisas.

6 comentários:

  1. Marina, tive uma infância como a sua e portanto defendo as lagartixas com todas as forças! E também ofereci levar a Lian para Barra Mansa, para ela aprender sobre as habilidades das lagartixas, mas ela logo recusou... aposto que é porque ela não quer admitir que está completamente enganada!!!

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  2. Voto pela lagartixa, e os argumentos estão muito bem construidos.

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  3. Adorei a foto da lagartixa sorrindo! ;-) E sim, Leilane, vamos levar essa menina rebelde p conhecer nossos centros de pesquisa e provar q estamos certas!

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  4. Comprovando que lagartixas conseguem ser ágeis:
    http://www.youtube.com/watch?v=nQgSnTDb8EY
    A partir de 1:40, ela se move mais rapidamente e dá o bote!
    P.S.: Adorei os textos!

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  5. Eu tb gosto das lagartixas, kkkk, sem piadinhas Lian!!! Nunca me incomodaram. A única situação constrangedora foi quando uma resolveu cair em mim durante um banho... ah neeemm ... Mas o fato delas comerem insetos é o que me faz adorar esses bichinhos rs

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  6. NAMORADOS (Manuel Bandeira)

    O rapaz chegou-se para junto da moça e disse:

    — Antônia, ainda não me acostumei com o seu corpo, com a sua cara.

    A moça olhou de lado e esperou.
    — Você não sabe quando a gente é criança e de repente vê uma lagarta listada?

    A moça se lembrava:

    — A gente fica olhando...


    A meninice brincou de novo nos olhos dela.

    O rapaz prosseguiu com muita doçura:

    — Antônia, você parece uma lagarta listada.

    A moça arregalou os olhos, fez exclamações.


    O rapaz concluiu:

    — Antônia, você é engraçada! Você parece louca.

    Saudades, Lian! Estarei aí dia 17! Beijos!

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